terça-feira, 19 de novembro de 2024

Dom Zanoni representa CNBB em Fórum Inter-religioso na cúpula do G20 Social no Rio Janeiro


O arcebispo de Feira de Santana (BA), dom Zanoni Demettino Castro, participou dia 14 de novembro, do Fórum Inter-religioso do G20 (IF20) em um painel na Cúpula do G20 Social no dia 14 de novembro de 2024, no Rio de Janeiro. No painel, intitulado “Combatendo fome, pobreza e desigualdades: Conclusões e recomendações do IF20”, o membro da Comissão Episcopal para o Ecumenismo e o Diálogo Interreligioso da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), apresentou a líderes globais a experiência da Igreja no Brasil por justiça, paz e dignidade humana.

“É uma honra unir-me a todos vocês nesta cúpula, em um momento que a humanidade enfrenta desafios profundos e complexos, como a fome, a pobreza e a desigualdade”, disse.

Segundo dom Zanoni, as comunidades religiosas têm um papel vital na construção de um futuro onde ninguém seja deixado para trás. “Este é o apelo do Fórum Inter-religioso do G20: que o engajamento com essas comunidades seja uma prioridade. A fé não pode ser isolada dos problemas concretos; ela deve se comprometer com a justiça social e a dignidade humana”, afirmou.

Com exemplo, o arcebispo de Feira de Santana apresentou o trabalho da Pastoral da Criança que salva vidas e garante um futuro para milhares em regiões vulneráveis. Outro trabalho que também apresentou foi o da Comissão Pastoral da Terra e da Comissão Pastoral dos Pescadores tem na sua natureza a luta pelo direito à terra e alimentação saudável, promovendo dignidade e autonomia nas comunidades.

Realmar a economia

De acordo com o arcebispo, a atuação ecumênica e inter-religiosa também é fundamental. Um exemplo de trabalho nesta direção é o da Cáritas brasileira, que trabalha com mulheres, migrantes e refugiados, impulsionando a economia solidária e fortalecendo mais de 21 mil iniciativas da Economia Popular Solidária no Brasil. “Esta é uma resposta concreta ao chamado do Papa Francisco para “realmar a economia” — colocando-a a serviço da vida”, reforçou.

Dom Zanoni apresentou a ação desenvolvida, em Antônio Cardoso (BA), onde a diocese sob seu pastoreio, junto à Cáritas, desenvolvem ações de fortalecimento para 12 comunidades quilombolas. “Estamos trabalhando para validar suas culturas, garantir sua autonomia e defender seus territórios. Essas comunidades são um exemplo de resiliência e de incidência política, avançando na defesa de direitos”, informou.

Ela apresentou aos participantes do Fórum Inter-religioso cinco áreas cruciais para um desenvolvimento humano integral: enfrentar a crise alimentar e a fome, o cuidado com o meio ambiente e a casa comum, a construção da paz e o alívio da dívida e o combate ao tráfico humano e à escravidão moderna também exigem nossa mobilização.

A campanha “Jubileu 2000” mostrou o impacto transformador de uma ação conjunta pela justiça econômica, e o Fórum Inter-religioso do G20 agora propõe um compromisso renovado para realmente “não deixar ninguém para trás.”

“Como alguém que testemunhou o compromisso de líderes religiosos e fiéis no Brasil, sei que essa responsabilidade é concreta. Durante a pandemia, a campanha ‘É Tempo de Cuidar’, organizada pela CNBB, mobilizou a Igreja para socorrer milhões de famílias. Foi uma resposta de compaixão concreta — algo que todos podemos fazer”, reforçou.

Dom Zanoni disse que a fome, a pobreza e a desigualdade podem e devem ser enfrentadas com compromisso e fé em ações concretas. “Que esta cúpula seja um marco para uma nova aliança entre fé e justiça, onde todos sejamos instrumentos de paz e promotores de um mundo justo e sustentável para cada pessoa, em todo lugar”, defendeu.

Por Willian Bonfim com fotos de dom Zanoni Demetino


Papa envia mensagem ao G20 no Brasil e pede ações concretas contra a fome e a pobreza


Na mensagem lida pelo cardeal Pietro Parolin, o Papa aborda a necessidade de solidariedade internacional e o redirecionamento de fundos militares para o combate à desigualdade. O Pontífice destaca o compromisso da Santa Sé e pede aos líderes reunidos no G20 ações concretas na redistribuição justa de recursos e decisões ousadas que garantam dignidade e alimento a todos.

Thulio Fonseca - Vatican News

O Papa Francisco enviou uma mensagem aos líderes do G20, reunidos no Rio de Janeiro, para tratar de temas como a urgência de ações concretas no combate à fome e à pobreza no mundo. A mensagem foi lida nesta segunda-feira, 18 de novembro, pelo Secretário de Estado do Vaticano, cardeal Pietro Parolin, durante o lançamento da Aliança Global Contra a Fome e a Pobreza.

No texto, endereçado ao presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, o Papa Francisco faz um apelo por solidariedade global e coordenação entre as nações para enfrentar injustiças sociais e econômicas, e sublinha que ações imediatas e conjuntas são indispensáveis para erradicar a fome e a pobreza, com foco na dignidade humana, no acesso aos bens essenciais e na redistribuição justa de recursos:

"É evidente que devem ser tomadas ações imediatas e decisivas para erradicar o flagelo da fome e da pobreza. Tais ações devem ser realizadas de forma conjunta e colaborativa, com o envolvimento de toda a comunidade internacional. A implementação de medidas eficazes requer um compromisso concreto dos governos, das organizações internacionais e da sociedade como um todo. A centralidade da dignidade humana, dada por Deus, de cada indivíduo, o acesso aos bens essenciais e a justa distribuição de recursos devem ser priorizados em todas as agendas políticas e sociais."

Aliança Global Contra a Fome e a Pobreza: a proposta da Santa Sé

Um dos pilares da mensagem é a abordagem de Francisco sobre a proposta de criação da Aliança Global Contra a Fome e a Pobreza. O Papa também alertou contra programas que ignoram as reais necessidades dos mais pobres e enfatizou que a fome resulta de desigualdades estruturais na distribuição de recursos, não da escassez de alimentos:

"A Aliança poderia começar implementando a proposta de longa data da Santa Sé, que propõe redirecionar fundos atualmente alocados para armas e outros gastos militares para um fundo global destinado a combater a fome e promover o desenvolvimento nos países mais empobrecidos. Essa abordagem ajudaria a evitar que os cidadãos desses países tivessem que recorrer a soluções violentas ou ilusórias, ou a deixar seus países em busca de uma vida mais digna."

Solidariedade internacional como base para o futuro

Ao destacar a importância de uma solidariedade internacional baseada na fraternidade e no cuidado com a casa comum, o Santo Padre pediu ao G20 que mantenha a luta contra a fome como prioridade permanente, não apenas em momentos de crise. Ao encerrar, Francisco instou os líderes a tomarem decisões ousadas e concretas:

"A Santa Sé continuará promovendo a dignidade humana e fazendo sua contribuição específica para o bem comum, oferecendo a experiência e o engajamento das instituições católicas ao redor do mundo, para que em nosso mundo nenhum ser humano, como pessoa amada por Deus, seja privado de seu pão diário. Que o Deus Todo-Poderoso abençoe abundantemente seus trabalhos e esforços para o verdadeiro progresso de toda a família humana."

G20 no Rio de Janeiro

O G20, que reúne as 20 maiores economias do planeta, realiza sua cúpula nos dias 18 e 19 de novembro de 2024, no Museu de Arte Moderna (MAM), no Rio de Janeiro. O lema do evento, "Construindo um mundo justo e um planeta sustentável", reflete o compromisso do Brasil em promover acordos globais que combinem prosperidade econômica com inclusão social e desenvolvimento ambiental.

O encontro ocorre em um momento crítico, com o aumento de conflitos internacionais, desigualdade econômica e crises climáticas. A programação inclui debates sobre segurança alimentar, mudanças climáticas, saúde global e reforma do sistema financeiro internacional.

Além disso, o evento busca representar um compromisso com uma governança global mais equitativa e com uma transição ecológica justa e inclusiva. Entre os líderes presentes estão representantes dos Estados Unidos, China, Índia, Itália, Alemanha, França, Japão e outros países.

Comissão da Santa Sé para o G20

A comissão da Santa Sé para o G20 é composta pelo cardeal Pietro Parolin, Secretário de Estado do Vaticano; dom Giambattista Diquattro, núncio apostólico no Brasil; cardeal Orani João Tempesta, arcebispo de São Sebastião do Rio de Janeiro; monsenhor Joseph Grech, secretário do cardeal Parolin; e por monsenhor André Sampaio, vigário episcopal do Rio de Janeiro.

ANO "B" - DIA: 19.11.2024
33ª SEMANA DO TEMPO COMUM (VERMELHO)
MARTÍRIO DE SÃO ROQUE GONÇALO, AFONSO RODRIGUES E JOÃO CASTILHO

— Aleluia, Aleluia, Aleluia.
— Por amor, Deus enviou-nos o seu filho, como vítima por nossas transgressões.
Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo + segundo Lucas
— Glória a vós, Senhor.

Naquele tempo, 1 Jesus tinha entrado em Jericó e estava atravessando a cidade. 2 Havia ali um homem chamado Zaqueu, que era chefe dos cobradores de impostos e muito rico. 3 Zaqueu procurava ver quem era Jesus, mas não conseguia, por causa da multidão, pois era muito baixo. 4 Então ele correu à frente e subiu numa figueira para ver Jesus, que devia passar por ali. 5 Quando Jesus chegou ao lugar, olhou para cima e disse: "Zaqueu, desce depressa! Hoje eu devo ficar na tua casa". 6 Ele desceu depressa, e recebeu Jesus com alegria. 7 Ao ver isso, todos começaram a murmurar, dizendo: "Ele foi hospedar-se na casa de um pecador!" 8 Zaqueu ficou de pé, e disse ao Senhor: "Senhor, eu dou a metade dos meus bens aos pobres, e se defraudei alguém, vou devolver quatro vezes mais". 9 Jesus lhe disse: "Hoje a salvação entrou nesta casa, porque também este homem é um filho de Abraão. 10 Com efeito, o Filho do Homem veio procurar e salvar o que estava perdido".

— Palavra da Salvação.
— Glória a vós, Senhor.

COMENTÁRIOS:
"Hospedar-me em sua casa"

Irmãos e irmãs, o texto que vamos ler neste dia está em Lucas, capítulo 19, versículos 1 a 10. E o trecho que escolhi diz assim:

“Quando Jesus chegou ao lugar, olhou para cima e disse: ‘Zaqueu, desce depressa, hoje eu devo ficar na tua casa.’ Ele desceu depressa e recebeu Jesus com alegria. Ao ver isso, todos começaram a murmurar, dizendo: ‘Ele foi hospedar-se na casa de um pecador.’ Zaqueu ficou de pé e disse ao Senhor: ‘Senhor, eu dou a metade dos meus bens aos pobres e, se defraudei alguém, vou devolver quatro vezes mais.’” (Lucas 19, 5-8)
Doce Hóspede

Então Zaqueu, irmãos e irmãs, é a última personagem que Jesus encontra antes de sua chegada em Jerusalém. Esse encontro é muito significativo. Zaqueu, como vemos aqui, estava perdido e faz a experiência da salvação.

Esse encontro aponta para tudo aquilo que Jesus vai viver em Jerusalém, tudo aquilo que Ele viverá futuramente, entregando sua vida e tudo mais em vista da nossa salvação.

E aqui, Zaqueu já prefigura cada um de nós. Um homem que tinha, de fato, uma vida longe de Deus, uma vida errada, mas Jesus pede para que ele desça depressa para fazer a experiência de um encontro verdadeiro com Ele.

Todos nós somos chamados a esse encontro pessoal com Jesus. O encontro pessoal que transforma nossa existência, um encontro pessoal com Jesus que transforma nossa vida para sempre.

O interessante é que Jesus é quem se convida para entrar na casa de Zaqueu. Isso nos recorda que o ato de fé é um ato de Deus. Deus nos faz crer, nos dá o ato de fé, nos ensina a nos aproximarmos d’Ele, tem a iniciativa da graça, e nós vamos correspondendo.

Aqui, Jesus se convida para entrar na casa de Zaqueu, assim como Ele se convida para entrar em nossa casa e em nossa vida também. Isso significa que Deus sempre tem a iniciativa. A iniciativa é de Deus para nossa salvação, e nós devemos corresponder com amor a esse chamado. Zaqueu desce depressa e O acolhe com alegria. Também nós devemos acolher o Senhor com alegria.

Essa alegria significa a alegria de quem acolhe a salvação em sua casa. A alegria de quem acolhe a salvação em sua vida.

Que você, neste dia, acolha Jesus em sua casa, acolha Jesus em sua vida, acolha e corresponda à iniciativa de Deus que quer a sua salvação.

Sobre vocês, desça e permaneça a bênção do Deus Todo-Poderoso: Pai, Filho e Espírito Santo. Amém.

Padre Edison Oliveira
Sacerdote da C. Canção Nova


A luta de Santo Agostinho para converter-se à vontade de Deus

Acompanhe as “batalhas interiores” travadas por Santo Agostinho para deixar a vida de pecado e abraçar o seu chamado à vida cristã.

FOTO: CATHOPIC

Neste oitavo livro das Confissões, Agostinho narra como ia se libertando das ambições seculares, mas ainda encontrava-se preso ao vínculo conjugal, que o impusera as obrigações próprias de quem tem esposa. Relata como teve quebrados os grilhões que o acorrentavam, impedindo-o de realizar uma conversão determinada. Os embates que se dão a nível espiritual e psicológico são dramáticos, culminando com a leitura bíblica, que descortinou a graça a seu favor.

Aqui é o centro das Confissões, o livro mais importante, pela rica e detalhada descrição do salto da para a fé deste gigante. Cada parágrafo vale a pena! A vida monástica, Santo Antão, sua agonia no jardim, os personagens Simpliciano e Ponticiano são degraus nesta escada. É emocionante e não tem como ler, sem olhar para nossa vida pessoal, indiferente à luta espiritual travada por Agostinho e seu magnífico desfecho.
Encontro com o pai na fé

Agostinho narra o encontro dele com Simpliciano, pai na fé de Santo Ambrósio. Diante deste renomado e sábio cristão, versado nas artes liberais, procura aconselhamento, buscando firmar sua convicção, mas ainda vacila na direção de uma conversão decidida. Dos lábios de Simpliciano, escuta como se deu a conversão progressiva de Vitorino, outrora participante de cerimônias sacrílegas e idolátricas. Vitorino, ao afirmar-se cristão, escuta dos lábios de Simpliciano: “enquanto não estiveres na Igreja de Cristo, não te poderás chamar assim.”

Qual o intuito por trás daquela provocação? A fé deveria ser professada publicamente em meio a um Roma paganizada e idolátrica, uma Babilônia, na qual seus cidadãos não se envergonhavam de prestar culto aos demônios. Para Simpliciano, a conversão de Vitorino só se efetivaria com a assunção pública de sua identidade cristã em uma época em que não faltavam o desprestigio e o desprezo por esta nova luz que despontava no império: a fé cristã!
A conversão de Vitorino

Vitorino, chamado a fazer a sua profissão de fé, teve a opção de fazê-la privadamente para que lhe fossem evitados contratempos e constrangimentos. Ele, porém, corajosamente, desejou fazê-la perante a assembleia dos santos, pois como, outrora, defendia no ensino da retórica, publicamente, suas sentenças, não queria se ocultar de confessar o cristianismo, com grande entusiasmo e dignidade. O povo cristão, com grande louvor o aclamava, levando-o, com alegria, em seus corações: “Vitorino, Vitorino!”


Há duas analogias bem interessantes, que Agostinho faz ao analisar a conversão de Vitorino e a de São Paulo Apóstolo. Interessante observar como ele lança este olhar a partir da sua própria alma. Indaga-se acerca de como compreender as escrituras, quando dizem que há mais alegria por um pecador convertido do que por noventa e nove justos, cita ainda a dracma perdida e a alegria do retorno do filho mais moço.

Desenvolve o seguinte raciocínio: o que estava ausente, o que foi perdido, o que se tornou padecente, carente de saciedade, de satisfação, se torna ainda mais prazeroso, evidente e marcante, quando compensado, do que nas habituais satisfações. Ele dá o exemplo de uma forte enfermidade, de uma fome severa, da ausência prolongada de algum bem.

Uma vez recuperada, a alegria e o contentamento são indizíveis. Assim, ele compara a conversão de alguém, outrora perdido para o demônio, com outro já redimido. A alegria da conversão de Vitorino foi marcante! A segunda analogia faz sobre a qualidade, a estirpe do convertido. Ainda que a conversão de um nobre e a de um cidadão comum sejam igualmente valorosas diante de Deus, quando um homem de projeção, eloquente, renuncia à soberba e faz uma profissão de fé pública, o impacto, a influência perante os outros, desperta mais pessoas a buscarem a Deus. Cita São Paulo que, embora se denomine o menor dos apóstolos, teve uma adesão ao cristianismo que impactou muitas pessoas.
A luta de Santo Agostinho

Como Santo Agostinho vai delineando sua conversão neste Livro VIII? Como um despertar do torpor, do adormecimento, após uma luta travada entre o novo e o velho que pelejam contra a vontade livre. Não é assim que dá conosco também? Está desperto, é melhor do que estar adormecido, mas por vezes, preferimos a comodidade e a preguiça, adiando o levantar, o despertar! É uma luta, pois a lei do pecado que arrasta nossos membros a fazer o que nos desagrada. Ele conclui esta parte assim: “Infeliz de mim, quem me libertará deste corpo de morte, senão tua graça por Jesus Cristo Nosso Senhor?” Agostinho vai sendo inspirado pela conversão de Vitorino narrada por Simpliciano.

No parágrafo 13, tópico 6, ele relata como foi sendo retirado dos desejos carnais e das ocupações seculares. Dedicava-se a estudos de retórica com os amigos Alípio, Nebrídio e com um professor de gramática, chamado Verecundo, um cidadão milanês. Ele e seus amigos estavam dedicados mais à retórica do que aos maiores ganhos que a atividade jurídica poderia proporcionar.


Mais adiante no Livro VIII, narra a visita, em sua casa, de Ponticiano, um notável concidadão africano que lhe foi ao encontro, enquanto ele estava sozinho com Nebrídio. Não recorda que assunto foram tratar.

Relata que Ponticiano, ao ver as epístolas paulinas, na casa de Agostinho, começa a falar acerca do cristianismo, mais propriamente de um famoso monge, de nome Antão. O visitante testemunha que, certa vez, ao sair para os arredores de Milão com algumas duplas de amigos para caminhar, relata como dois deles descobriram uma cela monástica.

Adentraram lá e se depararam com homens penitentes e piedosos, vivendo em pobreza, mergulhados na vida de oração. Isso os impressionou muito! Encontraram então um escrito com a biografia de Santo Antão, leram e profundamente comovidos interiormente, decidiram abraçar aquela vida bem-aventurada, que começava a despontar no ocidente.
Doutrinas sem coração
Ponticiano descreve que estes amigos tinham até noivas e na vida secular teriam expectativas de alcançar posição social privilegiadíssima, podendo chegar a serem amigos do imperador.

Tal relato, além da conversão de Vitorino, ia “mexendo” interiormente com Agostinho que, contrastando com aquela urgência e determinação, adiava dia a dia a sua conversão, numa postergação própria de adolescentes. Quanto à castidade, ele ia “empurrando para a frente”, conforme descreve o que se passava em seu âmago: ‘ “Concede-me castidade e continência, mas não agora”. Com efeito, receava que tu me atendesses logo, e logo me curasse da peste’.



Certo dia, inclinado sobre a própria consciência, sentiu que as palavras de Ponticiano refletiram de tal sorte em si, que começou a sentir vergonha de si mesmo. Além disso, imaginava terem sido inúteis os mais de doze anos de estudo de filosofia, de busca da sabedoria, se a sua própria alma, ele não era capaz de arrastá-la à uma tomada de decisão que o levasse à verdadeira felicidade. Penitenciou-se e sofreu bastante nesta ocasião!

Sentindo-se desafiado interiormente, volta-se para Alípio, dizendo: ‘ “Que toleramos? O que é isso? Que ouviste? Os ignorantes se levantam e conquistam o céu e nós, com nossas doutrinas sem coração, eis onde nos revolvemos na carne e no sangue! Envergonhamo-nos de segui-los, porque nos precederam, e não nos envergonhamos de nem sequer segui-los?” ’
Duas vontades

Aflige-se diante da vontade fragmentada ao afirmar: se a alma ordenar ao corpo, facilmente este a obedece; mas se a alma ordena a si mesma que faça algo, por vezes, esta não a obedece, pois está dividida, como se houvesse duas vontades: a que ordena e a que realiza. Às vontades conflitantes, contraria a doutrina dos maniqueus que pareciam afirmavam haver duas vontades, uma boa e a outra má naquela ambivalência dualista. Como explicamos no livro V das Confissões, os maniqueus afirmavam o pecado ser uma escolha de uma substância presente no homem, mas estranha a ele. Não são duas almas presentes no homem, para que se justifiquem duas vontades.

A vontade do homem é que é corrompida e os desejos por vezes são diversos, havendo, às vezes, mais de duas vontades a se colidirem, visto serem tantas as ambições humanas. Para ele a compreensão da fragilidade da vontade se dá pelo fato de sermos filhos de Adão. O comprometimento da vontade livre para buscar o bem, a quebra da unidade do querer e do executar se dá como reflexo da fragmentação, da divisão interior no homem, como herança da queda original.


Como há duas vontades, uma boa e uma má? A doutrina maniqueísta aqui é contrariada, quando se apresentam no homem vários desejos maus, que conflitam entre si: a chance de furtar um bem, de ser luxurioso, de ser avarento, de ir a espetáculos circenses ou ainda de roubar a casa alheia. São quatro os espíritos que desejam tais coisas? E quanto ao bem? Pode se desejar realizar uma leitura bíblica, fazer uma pregação, ouvir uma música. E quando as coisas celestiais estão em conflito com boas coisas lícitas? Que hierarquia deve ser aplicada? Enfim, embora o homem esteja dilacerado, é ele, um só, que padece de sua fragmentação, da perda de sua unidade.
Tentações

Agostinho se debatia de um lado para o outro em uma frenética luta entre a adesão determinada da conversão e a relutância em concretizá-la. Romper o laço tênue que o prendia era o grande desafio. Sentia que havia chegado a hora de avançar, mas recuava. Em suas próprias palavras:

“25.Assim sofria e me torturava, acusando a mim mesmo com mais dureza do que nunca, revirando-me e debatendo-me para romper definitivamente o laço que já me prendia apenas por um fio; mas ainda me prendia. E tu me pressionavas por dentro, Senhor, com misericórdia severa, alternando os flagelos do medo e da vergonha, para que não desistisse de novo e não deixasse de romper aquele laço exíguo e tênue que ainda restara, e ele não voltasse a se fortalecer e a me prender com maior força. Pois eu dizia dentro de mim: “Agora vai acontecer, agora vai”, e já ia me dispondo conforme minhas palavras. E quase me decidia, e não me decidia, porém não recaía na situação anterior, ficava perto e retomava o fôlego. Voltava a tentar e por pouco não chegava lá e por pouco, já, já, não alcançava e conseguia; mas não chegava lá, nem alcançava nem conseguia, hesitando em morrer para a morte e em viver para a vida, e dentro de mim o que era pior, porém familiar, tinha mais força do que o melhor, mas insólito, e aquele preciso instante em que algo novo aconteceria, quanto mais se aproximava, tanto mais me despertava repulsa; mas não recuava nem me esquivava, apenas permanecia em suspenso.”

Nesta comovente luta interior, Agostinho retrata com tamanha clareza, o que se passava em sua alma. Ouve as vozes da tentação, dizendo-lhe que não resistiria, que sucumbiria diante dos apelos dos prazeres carnais. Desestimulavam-no a avançar: “Vais nos deixar?” (vozes de mulheres? Talvez). Entre outras palavras, indagavam-no como ele viveria sem o usufruto de tais gozos. A antítese destas provocações foi a visão da continência com a consequente quietude e paz que residem numa alma casta. Era como uma dama elegante que lhe estendia a mão, acompanhada do entendimento de que a graça divina2 o poderia modificar. Uma voz encorajadora e estimulante começava a sobressair-se.

Em meio a esta lancinante batalha, sentiu um impulso de chorar amargamente, banhando-se em lágrimas neste conflito de si contra si mesmo. Chorou muito sob uma figueira.

Luz da fé

m seguida, ouviu uma voz, vinda de uma casa, que dizia: “pega e lê”. Agostinho volta-se para onde estava, ao lado de Alípio, abre as epístolas paulinas e lê o primeiro versículo onde pararam seus olhos, onde encontra o seguinte: “não em orgias e bebedeiras, nem em devassidão e libertinagem, nem em rixas e ciúmes, mas revesti-vos do Senhor Jesus Cristo e não procureis satisfazer os desejos da carne.” Tendo acabado de ler, sentiu uma luz penetrante em seu coração. Junto a Alípio, leu ainda o seguinte complemento, com seu amigo: “acolhei o fraco na fé.”

Em seguida foi contar à sua mãe, que havia sido finalmente conduzido a Deus. Após tantas fadigas, o que foi decisivo para o Santo foi a ação poderosa da graça, que transbordou por meio das letras sagradas, coroando o chamado divino, que será belissimamente retratado no poema “Tarde te amei”, no livro X.

Leia mais sobre a série de Resumos de Confissões:


Delcy Pereira Carvalho Filho
Graduando em Filosofia – Academia Atlântico

São Rafael de São José

José Kalinowski nasceu no dia 1 de setembro de 1835, na Polônia, filho de um casal de nobres. A sua vida e a sua fé desabrocharam à sombra do santuário carmelitano de Nossa Senhora de Ostra-Brama. Nos estudos, foi sempre aluno brilhante. Entrou na Academia Militar, de onde saiu graduado como tenente e engenheiro, e com apenas 25 anos foi promovido a Capitão do Estado Maior.

Em 1863 a Polônia insurgiu-se contra a Rússia, e José foi nomeado Ministro da Defesa da Lituânia, o que aceitou com a contrapartida de não haver condenações à morte. Conseguiu o fim da insurreição, mas ainda assim foi preso e condenado à morte, pena que acabaria por ser comutada para prisão perpétua, na Sibéria.

Tinha-se então afastado de Deus, mas confessou-se, o que valeu a sua verdadeira conversão. Na prisão, nunca se queixava, por maiores que fossem os tormentos, e estava sempre pronto a esquecer-se de si para ajudar os outros. Desenvolveu uma vida de intensa espiritualidade e devoção a Jesus, José e Maria. Suas únicas companhias foram um crucifixo e o livro “Imitação de Cristo”. Liberto e repatriado, entrou na Ordem dos Carmelitas Descalços, e tomou o nome de Rafael de São José, aos 42 de idade. Foi ordenado sacerdote, e através dele a Ordem refloresceu na Polônia.

Faleceu em Wadowice, muito doente, no dia 15 de novembro de 1907. O seu túmulo tornou-se lugar de peregrinação, e onde muitas vezes rezou o seu compatriota, Papa São João Paulo II, que o canonizou.

Colaboração: Padre Evaldo César de Souza, CSsR
Revisão e acréscimos: José Duarte de Barros Filho

Reflexão:

São Rafael de São José levou uma vida agitada, e os sucessos no mundo o levaram, apesar da boa formação católica, em certo período, a algum afastamento de Deus. Porém as boas raízes não deixaram que se sentisse feliz longe “de casa”, e o Sacramento da Confissão, ao qual depois, como sacerdote, muito enfatizou, lhe restituiu a paz e abriu caminho para a santidade. Que os pais não deixem de valorizar e cuidar esmeradamente da formação espiritual dos seus filhos, em especial da importância capital dos Sacramentos, fonte das graças que sempre tornarão possível qualquer necessária volta para Deus, a felicidade e paz nesta vida, e o prêmio da salvação.

Oração:

Ó Deus, que destes a São Rafael de São José o espírito de fortaleza nas contrariedades da vida, concedei-nos, por sua intercessão, a disposição de jamais abandonar a fé e de sempre buscarmos a reconciliação Convosco, de modo a podermos viver a verdadeira caridade para com os irmãos. Por Nosso Senhor Jesus Cristo, Sua Mãe Santíssima, e Seu pai José. Amém.

segunda-feira, 18 de novembro de 2024

Secretário-geral da CNBB: “as universidades católicas são chamadas a ser farol de esperança para o mundo”


O bispo auxiliar de Brasília e secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), dom Ricardo Hoepers, apresentou na quarta-feira, 13, às 16h, Hotel Ramada Brasília Alvorada, o painel: “Universidades Católicas: um farol para a Igreja no Brasil. O painel fez parte do Fórum de Reitores das Instituições de Ensino Católicas (IEC) promovido pela Associação Nacional das Entidades Católicas do Brasil (Anec) que refletiu sobre o tema do “referencial do humanismo solidário e o compromisso com a comunidade”.

Aos reitores, dom Ricardo reforçou que as universidades católicas no Brasil e no mundo são herdeiras de uma rica tradição de educação integral, orientada por uma visão que transcende a simples transmissão de conhecimentos. “Elas se fundamentam em uma missão de formar cidadãos não apenas capacitados tecnicamente, mas também comprometidos com o bem comum e com a dignidade humana”, destacou.


O secretário-geral da CNBB retomou trechos de uma conversa do Papa Francisco com a delegação da Federação Internacional de Universidades Católicas (FIUC), em janeiro de 2024: “Ajude-nos a traduzir culturalmente, em uma linguagem aberta às novas gerações e aos novos tempos, a riqueza da inspiração cristã; a identificar as novas fronteiras do pensamento, da ciência e da tecnologia e a habitá-las com equilíbrio e sabedoria. Ajude-nos a construir alianças intergeracionais e interculturais no cuidado da casa comum, em uma visão de ecologia integral, que ofereça uma resposta eficaz ao clamor da terra e ao clamor dos pobres.”

Sobre o tema do painel, dom Ricardo pontuou que a figura do farol representa sempre uma referência para o navegador, nunca é destino. “Ele assegura a continuidade do caminho, aponta para que lado devemos ir e para o lado que não devemos ir”, disse.

Missão das IEC

Ao refletir sobre a missão das universidades católicas, o bispo auxiliar de Brasília reforçou o que foi apontando pelo Papa Francisco, no documento “Veritatis Gaudium”: “As universidades e faculdades eclesiásticas têm o desafio de formar “uma comunidade de saber e de vida que, iluminada pela verdade de Deus e do homem, ao serviço da Igreja e da sociedade, contribua para a promoção da justiça e da paz” (Veritatis Gaudium, Proêmio, 1).

Dom Ricardo pontuou que as IES católicas são, assim, um espaço para a vivência de um “humanismo solidário”, conceito que vai ao encontro do documento “Educar para um humanismo solidário”, da Congregação para a Educação Católica. “As universidades católicas são chamadas a serem um refúgio e uma fonte de esperança, especialmente em tempos de crise social e ambiental” reforçou.

O secretário-geral da CNBB enalteceu a importância das IECs para a Igreja no Brasil e fez para os reitores o mesmo convite à sinodalidade que o Papa está fazendo à Igreja e aos cristãos: repensar nosso modo de ser e agir dentro da Igreja, recuperar o frescor do Evangelho e das primeiras comunidades, celebrar a misericórdia e a esperança em espírito jubilar, aprimorarmos nossa atividade pastoral em comunhão, participação e missão”. afirmou.

Dom Ricardo apresentou o processo em curso na Igreja no Brasil de elaboração das Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil (DGAE) para os próximos quatro anos a serem aprovadas na 62ª Assembleia da CNBB em abril de 2025.

Por fim, reforçou um pedido do Papa: “ajudem a Igreja…”, na linha da eclesiologia do Concílio Vaticano II, e escutando mais o que o processo do Sínodo tem oferecido, cresce a necessidade de valorizarmos mais nossa Igreja Local, renovando o senso de pertença à diocese e à paróquia, a diocesaneidade. E cientes de que a evangelização é sempre comunitária, desperta-se o senso de sinodalidade, de caminhar juntos”, disse.

Dom Ricardo concluiu dizendo que “temos o chamado de não apenas iluminar o caminho acadêmico e profissional dos jovens, mas de sermos verdadeiros faróis, inspirando e promovendo uma visão de mundo onde o saber e o humanismo caminham de mãos dadas e onde apontamos para a verdadeira luz, que é Cristo”.
Participantes do Fórum de Reitores das Instituições de Ensino Católicas. 
Fotos: Wey Alves.

Para saber mais:
Acesse na íntegra o texto do discurso do secretário-geral da CNBB: Universidades Católicas: um Farol para a Igreja do Brasil.

Por Willian Bonfim


Papa Francisco: por favor, não nos esqueçamos dos pobres


Na missa do VIII Dia Mundial dos Pobres, Francisco faz um apelo aos governos e às organizações internacionais, mas convida a Igreja a sentir “a mesma compaixão do Senhor” diante dos últimos, e pede aos cristãos que se tornem “sinal da presença do Senhor”, pertos do sofrimento dos necessitados para aliviar suas feridas e mudar sua sorte: só assim a Igreja “se torna ela mesma, casa aberta a todos”.

Alessandro Di Bussolo - Vatican News

“Por favor, não nos esqueçamos dos pobres!”. A invocação com a qual o Papa Francisco encerra sua homilia na missa do VIII Dia Mundial dos Pobres neste domingo (17/11), na Basílica de São Pedro, é dirigida à Igreja, aos governos dos Estados e às organizações internacionais, mas também “a todos e a cada um”. E aos fiéis em Cristo, o Papa nos lembra que “é a nossa vida impregnada de compaixão e de caridade que se torna sinal da presença do Senhor, sempre próximo do sofrimento dos pobres, para aliviar as suas feridas e mudar a sua sorte”. Porque a esperança cristã precisa de “cristãos que não se viram para o outro lado” e que sintam “a mesma compaixão do Senhor diante dos pobres”. Francisco sublinhou isso lembrando uma advertência do cardeal Martini: somente servindo os pobres “a Igreja ‘torna-se’ ela mesma, isto é, uma casa aberta a todos, um lugar da compaixão de Deus pela vida de cada homem”.

A missa na Basílica de São Pedro

Jesus se tornou pobre por nós

Em uma Basílica lotada, com a presença dos pobres que mais tarde almoçam com ele na Sala Paulo VI, o Pontífice abre a celebração com a exortação do ato penitencial: “Com o olhar fixo em Jesus Cristo, que se fez pobre por nós e rico de amor para com todos, reconheçamos que precisamos da misericórdia do Pai”. O celebrante no altar é o arcebispo Rino Fisichella, pró-prefeito do Dicastério para a Evangelização.

Na escuridão deste tempo, brilha uma esperança inabalável

Na homilia, o Papa Francisco relê a passagem do Evangelho de Marcos, na liturgia deste XXXIII Domingo do Tempo Comum, com as palavras de Jesus aos discípulos antes de sua paixão, descrevendo “o estado de espírito daqueles que viram a destruição de Jerusalém”, mas também a chegada extraordinária do Filho do Homem. “Quando tudo parece desmoronar-se, que Deus vem, que Deus se aproxima, que Deus nos reúne para nos salvar”.

Jesus convida-nos a ter um olhar mais aguçado, a ter olhos capazes de “ler por dentro” os acontecimentos da história, para descobrir que, mesmo na angústia dos nossos corações e dos nossos tempos, há uma esperança inabalável que resplandece.

Angústia e impotência diante da injustiça do mundo

Neste Dia Mundial dos Pobres, portanto, o Papa nos convida a nos determos nas duas realidades, “angústia e esperança, que sempre duelam entre si na arena do nosso coração”. Ele começa com a angústia, tão difundida em nosso tempo, “onde a comunicação social amplifica os problemas e as feridas, tornando o mundo mais inseguro e o futuro mais incerto”. Se o nosso olhar, enfatiza, “se detém apenas na crônica dos acontecimentos, dentro de nós a angústia ganha terreno”, porque ainda hoje, como na passagem do Evangelho, “vemos o sol escurecer e a lua se apagar, vemos a fome e a carestia que oprimem tantos irmãos e irmãs, vemos os horrores da guerra e a morte de inocentes”. E corremos o risco de “afundarmos no desânimo e de não nos apercebermos da presença de Deus no drama da história. Assim, condenamo-nos à impotência".

Vemos crescer à nossa volta a injustiça que causa a dor dos pobres, mas juntamo-nos à corrente resignada daqueles que, por comodismo ou por preguiça, pensam que “o mundo é assim mesmo” e que “não há nada que eu possa fazer”. Desse modo, até a própria fé cristã é reduzida a uma devoção inócua, que não incomoda os poderes deste mundo e não gera um compromisso concreto de caridade.

A ressurreição de Jesus acende a esperança

Francisco cita a sua Exortação Apostólica Evangelii gaudium para nos lembrar que, “enquanto crescem as desigualdades e a economia penaliza os mais fracos, enquanto a sociedade se consagra à idolatria do dinheiro e do consumo”, acontece que “os pobres e os excluídos não podem fazer outra coisa senão continuar a esperar”. Mas no quadro apocalíptico que acaba de ser descrito no Evangelho, Jesus “acende a esperança”, descrevendo a chegada do Filho do Homem “com grande poder e glória”, para reunir “os seus eleitos dos quatro ventos”. Assim, ele “alarga o nosso olhar para que aprendamos a perceber, mesmo na precariedade e na dor do mundo, a presença do amor de Deus que se faz próximo, que não nos abandona, que atua para a nossa salvação”. Jesus, lembra o Pontífice, está apontando “inicialmente para a sua morte que terá lugar pouco depois”, mas também para “o poder da sua ressurreição” que destruirá as cadeias da morte, “e um mundo novo nascerá das ruínas de uma história ferida pelo mal”. Jesus nos dá essa esperança por meio da bela imagem da figueira: “quando seus ramos ficam verdes e as folhas começam a brotar, sabeis que o verão está perto”.

Do mesmo modo, também nós somos chamados a ler as situações da nossa história terrena: onde parece haver apenas injustiça, dor e pobreza, precisamente naquele momento dramático, o Senhor aproxima-se para nos libertar da escravidão e fazer brilhar a vida.

Você olha nos olhos a pessoa que ajuda?

E isso é feito, ele explica, “com nossa proximidade cristã, com a nossa fraternidade cristã”.

Não se trata de jogar uma moeda nas mãos de quem precisa. Àquele que dá a esmola, eu pergunto duas coisas: “Você toca as mãos das pessoas ou joga a moeda sem tocá-las? Você olha nos olhos a pessoa que ajuda ou desvia o olhar?”.

Precisamos aliviar as feridas dos pobres, exortou o Papa

Perto do sofrimento dos pobres

Cabe a nós, seus discípulos, continua o Papa Francisco, que graças ao Espírito Santo podemos semear essa esperança no mundo. “Somos nós" - e aqui ele cita sua Encíclica Fratelli tutti - "que podemos e devemos acender luzes de justiça e de solidariedade, enquanto se adensam as sombras de um mundo fechado".

Somos nós que a sua Graça faz brilhar, é a nossa vida impregnada de compaixão e de caridade que se torna sinal da presença do Senhor, sempre próximo do sofrimento dos pobres, para aliviar as suas feridas e mudar a sua sorte.

Desvio o olhar diante da dor dos outros?

Não esqueçamos, é a invocação do Papa, que a esperança cristã, “que se realizou em Jesus e se concretiza no seu Reino, precisa de nós e do nosso empenho, de uma fé operosa na caridade, de cristãos que não passam para o outro lado do caminho". E aqui ele lembra a imagem de um fotógrafo romano de um casal de adultos saindo de um restaurante, que olhava para o outro lado para não cruzar dom o olhar de “uma pobre senhora, deitada no chão, pedindo esmolas”.

Isso acontece todos os dias. Perguntemos a nós mesmos: eu olho para o outro lado quando vejo a pobreza, as necessidades, a dor dos outros?

Francisco cita então um teólogo do século XX, Metz, quando dizia que a fé cristã deve gerar em nós uma “mística de olhos abertos”: “não uma espiritualidade que foge do mundo, mas, pelo contrário, uma fé que abre os olhos aos sofrimentos do mundo e às aflições dos pobres, para exercer a mesma compaixão de Cristo”.

“Eu sinto a mesma compaixão do Senhor diante dos pobres, diante daqueles que não têm trabalho, que não têm o que comer, que são marginalizados pela sociedade?”

Mesmo com o nosso pouco, podemos melhorar a realidade

E, continua o Papa Francisco, “não devemos olhar apenas para os grandes problemas da pobreza mundial, mas para o pouco que todos nós podemos fazer todos os dias".

Com o nosso estilo de vida, com o cuidado e a atenção pelo ambiente em que vivemos, com a busca tenaz da justiça, com a partilha dos nossos bens com os mais pobres, com o engajamento social e político para melhorar a realidade que nos rodeia..

Por favor, não nos esqueçamos dos pobres

Assim, “o nosso pouco será como as primeiras folhas que brotam na figueira: uma antecipação do verão que está próximo”. Concluindo, o Papa recorda uma advertência do cardeal Carlo Maria Martini, quando disse “que devemos ter cuidado ao pensar que existe primeiro a Igreja, já sólida em si mesma, e depois os pobres dos quais escolhemos cuidar. Na realidade, tornamo-nos a Igreja de Jesus na medida em que servimos os pobres, pois somente assim «a Igreja “torna-se” ela mesma, isto é, uma casa aberta a todos, um lugar da compaixão de Deus pela vida de cada homem»”.

Digo-o à Igreja, digo-o aos governos dos Estados e às organizações internacionais, digo-o a todos e a cada um: por favor, não nos esqueçamos dos pobres.

Projeto de caridade pela Síria e almoço com os pobres

Antes da missa, o Papa Francisco abençoou simbolicamente 13 chaves, representando os 13 países nos quais a Famvin Homeless Alliance (FHA), da Família Vicentina, construirá novas casas para pessoas necessitadas com o Projeto “13 Casas” para o Jubileu. Entre esses países está também a Síria, cujas 13 casas serão financiadas diretamente pela Santa Sé como um gesto de caridade para o Ano Santo. Um ato de solidariedade que se tornou possível graças a uma generosa doação da UnipolSai, que desejou entusiasticamente contribuir, no período que antecedeu o Ano Santo, com esse sinal de esperança para uma terra ainda devastada pela guerra.

No final da missa e após a recitação do Angelus, o Papa almoça na Sala Paulo VI junto com 1.300 pessoas pobres. O almoço, organizado pelo Dicastério para o Serviço da Caridade, é oferecido este ano pela Cruz Vermelha Italiana e animado por sua Fanfarra Nacional. No final do almoço, cada pessoa recebe uma mochila oferecida pelos Padres Vicentinos (Congregação da Missão), contendo alimentos e produtos de higiene pessoal.


EVANGELHO DO DIA (Lc 18,35-43)

ANO "B" - DIA: 18.11.2024
33ª SEMANA DO TEMPO COMUM (VERDE)

— Aleluia, Aleluia, Aleluia.
— Eu sou a luz do mundo; aquele que me segue não caminha entre as trevas, mas terá a luz da vida
Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo + segundo Lucas
— Glória a vós, Senhor.

Quando Jesus se aproximava de Jericó, um cego estava sentado à beira do caminho, pedindo esmolas. 36 Ouvindo a multidão passar, ele perguntou o que estava acontecendo. 37 Disseram-lhe que Jesus Nazareno estava passando por ali. 38 Então o cego gritou: "Jesus, filho de Davi, tem piedade de mim!" 39 As pessoas que iam na frente mandavam que ele ficasse calado. Mas ele gritava mais ainda: "Filho de Davi, tem piedade de mim!" 40 Jesus parou e mandou que levassem o cego até ele. Quando o cego chegou perto, Jesus perguntou: 41 "O que queres que eu faça por ti?" O cego respondeu: "Senhor, eu quero enxergar de novo". 42 Jesus disse: "Enxerga, pois, de novo. A tua fé te salvou." 43 No mesmo instante, o cego começou a ver de novo e seguia Jesus, glorificando a Deus. Vendo isso, todo o povo deu louvores a Deus.

— Palavra da Salvação.
— Glória a vós, Senhor.

COMENTÁRIOS:
"Senhor, que eu veja!"

Irmãos e irmãs, olá. Hoje, o texto que nos é apresentado na liturgia, no Evangelho de hoje, é Lucas 18, 35 a 43. Ele nos conta a história do cego, e o trecho que quero destacar diz o seguinte:

“Jesus parou e mandou que levassem o cego até ele. Quando o cego chegou perto, Jesus perguntou: ‘O que queres que eu faça por ti?’ O cego respondeu: ‘Senhor, eu quero enxergar de novo.’” (Lucas 18, 40-41)

Essa pergunta também nos coloca em uma profunda reflexão: será que temos consciência do que queremos diante de Deus, quando nos apresentamos em oração?

Jesus faz uma pergunta direta e certeira: “O que queres que eu faça por ti?”. Parece algo lógico, afinal, sendo cego, o natural seria querer voltar a enxergar. Mas Jesus queria ouvir isso diretamente dele, sair da própria boca do cego.
Ver Jesus

Esse cego do Evangelho, irmãos e irmãs, pode simbolizar nossa própria vida de fé. Quantas vezes caminhamos sem a luz da fé a nos iluminar?

Deveríamos rezar assim: “Senhor, aumenta a minha fé! Eu não sou digno de que entres em mim, mas dize uma palavra e serei salvo.” (Como rezamos na Santa Missa).

Talvez nossa vida tenha sido, até aqui, uma vida de cegueira, uma vida de pessoas que caminham como cegos, sem a fé que ilumina e impulsiona.

Nós cremos, irmãos e irmãs, porque Deus nos faz crer. A fé é um dom, ela vem pela escuta da palavra, nos é oferecida. Nós correspondemos a essa graça e aprendemos, a cada dia, a dar passos e fazer escolhas a partir da fé.

Deus nos faz crer, nos direciona e nos impulsiona. O ato de fé é muito mais do que escolher aquilo que nos convence ou o que achamos ser melhor para nós. O ato de fé é se colocar sob a tutela de Deus, sob o Seu cuidado. Deus cuida de você, Ele o direciona, aponta os caminhos e ilumina, tirando você da cegueira.

É dizer como o cego: “Jesus, filho de Davi, tem piedade de mim, pois por mim mesmo tudo estaria perdido.” O que seria de mim sem Ti, sem a Tua presença, sem a Tua graça?

Que, neste dia, o Senhor faça a fé crescer em nosso coração.

Sobre vocês, desça e permaneça a bênção do Deus Todo-Poderoso: Pai, Filho e Espírito Santo. Amém!

Padre Edison Oliveira
Sacerdote da C. Canção Nova