sexta-feira, 28 de outubro de 2022

As Artes, as Letras, a Teologia e a Liturgia no século IV


A arte cristã se desenvolveu no século IV libertada das influências pagãs. Com a conversão de Constantino a arte cresceu em forma de basílicas, objetos cristãos, ornamentos evangélicos, mosaicos cristãos etc. Prudêncio falou das basílicas de Constantino com “pinturas multicores, refletindo nos lagos o seu ouro […]. Tetos com vigas de ouro, que fazem de toda a sala como o nascer do sol. Nos vãos vitrais rutilantes, semelhantes a prados repintados de flores” (Rops, Vol. I, p. 517).

Os Padres da Igreja veem nesta arte uma utilidade apologética. Disse São Basílio que “o que a linguagem da história ensina pelo ouvido, mostra-o o silencioso desenho pela reprodução”. São Gregório de Nissa disse que o desenho nas paredes “presta os maiores serviços”, e o mosaico “torna dignas da história as pedras que pisamos com os pés”. Depois, Victor Hugo chamou a Catedral da Idade Média de a “Bíblia de Pedra”. Surge assim nas paredes das igrejas um “livro de piedade e espiritualidade” que poderão ler os iletrados. Nasce com esta arte um novo sistema de ensino e tradição, onde a figura gloriosa de Jesus está centralizada. As esculturas em baixo relevo são abundantes nas igrejas e nos sarcófagos. O Cristianismo orientou a arte para o louvor a Deus e a Lei de Cristo.

Também as letras cristãs se desenvolveram, pois muitos intelectuais foram conquistados pelo Evangelho, e a literatura cristã foi substituindo a pagã. Os Padres da Igreja foram impregnados pelos clássicos antigos, como Virgílio que Santo Ambrósio citava e imitava, mas fugindo de uma retórica vazia. Cícero era citado e imitado da mesma forma, mas com um novo espírito cristão.

Eusébio de Cesareia (265-340) erudito e estudioso, escreveu a sua História Eclesiástica, sem o qual não conheceríamos muitos acontecimentos dos três primeiros séculos. Escreveu também a Crônica ou História Universal, onde retomou a obra de Julio Africano, estabelecendo um paralelo entre a Bíblia e a história profana, e nos deixou a “Vida de Constantino”. Eusébio foi o precursor de outros historiadores cristãos como Sulpício Severo, Orósio, Sócrates, Sozomeno e Teodoreto.

Na poesia cristã teremos o nome do grande Prudêncio (348-410), advogado espanhol; e Santo Efrém com seus milhões de versos a Virgem Maria. Com os Padres da Igreja, em grande número, se desenvolveu a teologia, a exegese, a filosofia e outras disciplinas, tanto em Alexandria, como em Antioquia na Capadócia.


Às margens do Mar Negro encontramos os gigantes “Padres da Capadócia”: São Basílio Magno, doutor da Igreja; seu irmão São Gregório de Nissa e o amigo São Gregório Nazianzeno, doutor da Igreja, que foram decisivos na elucidação do mistério da Santíssima Trindade. E na África teremos o gênio Santo Agostinho. São Jerônimo de Roma, e São João Crisóstomo de Constantinopla, serão dois grandes personagens das letras cristãs.

No século IV, a Igreja praticamente concluiu a definição dos Livros Canônicos. Em 367 d.C. na Páscoa, Santo Atanásio escreveu uma epístola onde relacionou os livros aceitos como canônicos pelos cristãos; no parágrafo 7 listou também os livros que hoje conhecemos como “deuterocanônicos” do Antigo Testamento (rejeitados pelos protestantes), deixando de lado apenas os livros dos Macabeus.

A Igreja estabeleceu o cânon bíblico mais tarde em 393 e 397, nos concílios regionais de Hipona e Cartago, no tempo de Santo Agostinho, e pelo Papa Inocêncio I (401-417), em 405, ao dirigir-se ao bispo de Tolosa.

Veremos nesse século surgir a força extraordinária do monaquismo, que começou no Egito com Santo Antão, e os “Padres do deserto”, e foi levado para o Ocidente por Santo Atanásio, em seu refúgio, em Roma, e por outros santos.

No século IV houve um grande marco litúrgico: as cerimônias tiveram mais precisão e solenidade com características próprias no Oriente e Ocidente, porém os mesmos elementos essenciais. As diferenças são apenas pormenores. O Concílio de Niceia (325) falou dos quarenta dias da Quaresma em preparação da Páscoa. Foram fixadas as grandes festas da Páscoa: Ascensão do Senhor e Pentecostes. O Natal foi fixado no Ocidente para o dia 25 de dezembro, para cristianizar e substituir a festa do deus Sol invictus, festa pagã da religião Mitra. No Oriente adotou-se a data de 6 de janeiro. E surgiu, sobretudo com São Basílio e Santo Ambrósio, o canto dos Salmos.

Nesse século havia uma vida sacramental considerável; os fiéis comungavam não só aos domingos, mas até quatro vezes por semana em Cesareia; e São Basílio Magno (330-369) incentivava a comunhão diária. Santo Ambrósio escreveu Os mistérios, sobre os Sacramentos, sobretudo insistiu na presença real de Cristo na Eucaristia após as palavras da consagração.

São Cirilo de Jerusalém (315-386) assim falava aos fiéis:

“Na cavidade da mão recebe o Corpo de Cristo; dize Amém e com zelo santifica os olhos ao contato do corpo santo […]. Depois, aproxima-te do cálice. Dize Amém e santifica-te tomando o Sangue de Cristo. A seguir, toca de leve os teus lábios, ainda úmidos, com tuas mãos, e santifica os olhos, a testa e os outros sentidos”.

Santo Efrém Sírio (306-444) falava da Eucaristia como “Glória ao remédio da vida”. Santo Agostinho (354-430) a chamava de “o pão de cada dia, que se torna como o remédio para a nossa fraqueza de cada dia”. E ainda dizia:

“Ó reverenda dignidade do sacerdote, em cujas mãos o Filho de Deus se encarna como no Seio da Virgem. A virtude própria deste alimento divino é uma força de união que nos une ao Corpo do Salvador e nos faz seus membros a fim de que nos transformemos naquilo que recebemos”.

São Cirilo de Alexandria (370-444) dizia que ao comungarmos o Corpo de Cristo nos transformamos em “Cristóforos”, portadores de Cristo. Nesse século cresce também a veneração aos santos, que se iniciou nos séculos anteriores com o culto aos mártires.

Eusébio de Cesareia (260-340) diz:

“Temos o costume de nos reunir sobre os seus túmulos, de fazer ali as nossas orações e de honrar assim as suas almas bem-aventuradas”.

Surgem muitas jaculatórias, talvez a mais famosa dirigida ao Mestre: “Senhor Jesus Cristo, Filho de Deus, tende piedade de nós!”.

Retirado do livro: “História da Igreja – Idade Antiga”. Prof. Felipe Aquino. Ed. Cléofas.



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