segunda-feira, 30 de setembro de 2024

São Jerônimo


Sofrônio Eusébio Jerônimo nasceu em Estridão ou Estridônia, entre a Dalmácia e a Panônia (atualmente uma região entre Croácia e Hungria), entre os anos 340 e 347. Sua família era católica, culta e rica, e ele, filho único, teve a oportunidade de estudar em Roma, onde estudou Retórica, Oratória e Gramática com grandes mestres, além de Filosofia, e da dedicação à leitura de grandes autores, como Virgílio, Terêncio, Cícero e Platão.

Entregou-se a uma vida um tanto desregrada, mas, arrependendo-se, voltou à Fé da infância passou a se dedicar unicamente aos estudos dos textos santos. Foi batizado já adulto, como era costume na época, por volta dos 25 anos. Formou uma grande biblioteca. Seguiu para Tréveros, uma das mais conceituadas academias do Ocidente, para estudar Teologia. Em seguida, viajou para a Gália, atual França, onde se uniu a um grupo de monges. Formou ali uma comunidade dedicada ao estudo da Bíblia e das obras teológicas.

Por volta de 373-374 peregrinou à Terra Santa, mas uma doença o reteve durante muito tempo em Antioquia (atualmente Antáquia na Turquia), onde aprendeu o Grego. Seu temperamento forte e radical o levou a buscar uma vida eremítica no deserto de Cálcida, na Síria. Ali com muita dificuldade, esforço e empenho, aprendeu Hebraico com um convertido judeu. Sua vida ascética, de jejuns e orações, era tão extrema que quase morreu.

Depois de uns quatro anos, em 379, em Antioquia, aceitou o sacerdócio pelas mãos do bispo Paulino, mas somente após a promessa de que não teria trabalhos pastorais: sua vocação era a vida eremítica/monacal centrada na ascese, oração e estudos. Seguindo para Constantinopla, atual Istambul na Turquia, conheceu São Gregório Nazianzeno, que lhe estimulou ainda mais o amor pelo estudo das Sagradas Escrituras.

Chamado pelo Papa São Dâmaso I a Roma, em 382, para participar de um sínodo, acabou como seu secretário particular e incumbido por ele de traduzir a Bíblia para o Latim, uma vez que sua erudição, firmeza doutrinária e conhecimento do Grego e do Hebraico, as línguas originais das Escrituras, o tornavam particularmente apto a fazer este grandioso e necessário serviço. Iniciou o trabalho em Roma, em 383, e só o terminou em Belém da Judéia, entre 404-406, um período de cerca de 23 anos.

A versão final, conhecida por Vulgata (do Italiano “comum”, “corrente”, isto é acessível à leitura mais popular na Europa), embora não seja na íntegra de sua lavra, é a primeira tradução para o Latim, e a base para todas as traduções nas línguas modernas. Durante séculos foi a referência da Igreja, aprovada e oficializada no Concílio de Trento (1545-1563). E ainda hoje, embora revisada, é o texto oficial da Igreja de língua latina. Isto porque é extremamente fiel aos textos originais, além de apresentar riqueza de informações pertinentes.

Santo Isidoro de Sevilha (cerca de 560 a 636), na sua monumental obra Etimologias, diz que “Jerônimo era perito em três línguas, por isso sua interpretação é preferível à dos outros: ele apreende melhor o sentido das palavras e suas expressões são claras e transparentes. Além do que, sendo cristão, sua interpretação é verdadeira”.

Jerônimo ficou em Roma até 385, partindo depois para Jerusalém, acompanhado de Santa Paula e outros peregrinos. Depois de visitarem os lugares santos, ele viajou para o deserto da Nítria, Egito, visitando colônias monásticas, até voltar definitivamente para Belém em 386.

Santa Paula era rica, e pôde ajudar na construção de três mosteiros femininos e um masculino em Belém, no qual Jerônimo morou por 34 anos. Também foram erguidas hospedarias para os peregrinos, e ele se dedicou a este acolhimento, à oração, penitência e enorme atividade literária, além do ensino da cultura clássica e cristã.

A sua grande biblioteca, formada ao longo dos anos, crescera ainda mais. As controvérsias dogmáticas da época repercutiram em Belém, e Jerônimo, engajado nos problemas doutrinários da sua época, sempre defendeu vigorosamente a Fé, por escritos, sendo um polemista agressivo e eficaz. Os hereges pelagianos incendiaram seu mosteiro em 414, colocando sua vida e risco, e sucederam-se ataques dos Hunos, dos montanheses da Isáuria e dos piratas sarracenos, que obrigaram os monges a fugir temporariamente.

Seus últimos trabalhos foram relativos à organização do Ofício eclesiástico, com seus cânticos para o ano todo, por encomenda do Papa São Dâmaso I. Enviado a Roma de Belém, a composição foi aprovada pelo Sumo Pontífice e pelos cardeais, que determinaram a sua autenticidade perpétua. Depois disso, mandou construir para si um túmulo na entrada da gruta do sepulcro de Jesus. Faleceu na sua cela, perto da Gruta da Natividade, lúcido até o final, com idade entre 80 e 90 anos, no dia 30 de setembro, por volta do ano 420.

São Jerônimo é o padroeiro dos Estudos Bíblicos, e o Dia da Bíblia foi colocado no dia da sua morte. É também patrono das Escolas Superiores e Faculdades Teológicas. Além dos Santos Ambrósio, Agostinho e Gregório Magno, é também um dos quatro Padres da Igreja Ocidental com o título de Doutor da Igreja.

Sendo um autor de cultura enciclopédica, sua vasta obra inclui, além da Vulgata, biografias de 135 outros autores, cristãos, judeus e pagãos, no livro De Viris Illustribus, o Chronicon, sobre a História Universal desde o nascimento de Abraão até o ano 325 (uma tradução e reelaboração em Latim de uma obra em Grego), comentários, homilias, epístolas, tratados e cartas, muitas delas em correspondência com Santo Agostinho.

Seu temperamento e personalidade muito fortes gerava ódio nos inimigos e amor nos amigos, como por exemplo o carinho que lhe foi registrado por Santo Agostinho e pelo bem-aventurado Próspero. Um discípulo de São Martinho, Sulpício Severo, dele escreve: “… Jerônimo (...), cujos combates e lutas contra os maus eram incessantes.

Os hereges o odiaram porque ele sempre os atacou; os clérigos, porque sempre lhes repreendeu os crimes e a maneira de viver. Mas todas as pessoas de bem o admiravam e amavam. (...) Ele está sempre lendo, sempre no meio dos livros, sempre lendo ou escrevendo, não repousa nem de dia nem de noite.”

De si próprio, São Jerônimo deixou registrado: “Dou graças a Deus de ser digno do ódio do mundo. Falam de mim como de um malfeitor, mas sei que, para chegar ao Céu, é preciso suportar tanto a boa quanto a má reputação”.

Colaboração: José Duarte de Barros Filho

Reflexão:

Independentemente de qualquer outra obra, a Vulgata já daria a São Jerônimo um lugar especialíssimo entre os maiores escritores católicos e santos de todos os tempos, sendo para sempre merecedor de um agradecimento sem medida pela Igreja. O Papa São Dâmaso I, no seu tempo, percebeu o perigo gravíssimo que a falta de uma leitura correta da Bíblia poderia trazer, com deturpações monstruosas passando-se por “palavras de Deus”, e afastando as almas da salvação. Também hoje há inúmeras traduções bíblicas suspeitas, outras com erros graves mesmo, e portanto vale a pena o católico buscar com prudência o que lhe está sendo oferecido como inspirado pelo Espírito Santo. Como escreveu São Jerônimo, “Cristo é o poder de Deus e a sabedoria de Deus, e quem ignora as Escrituras, ignora o poder e a sabedoria de Deus; portanto, ignorar as Escrituras Sagradas é ignorar a Cristo.” A formação, o estudo e o ensino da Doutrina, que obviamente remete à Bíblia, não é um luxo para os fiéis, mas sim uma necessidade fundamental, especialmente nos dias atuais, onde tão facilmente a divulgação de erros é não só permitida como fomentada. Enfim, se não na mesma forma dos jejuns, penitências e cansaços extremos de São Jerônimo, somos todos, os católicos, obrigados em consciência a viver, como ele, a radicalidade na vivência e na defesa da Fé, e para isso precisamos conhecê-la corretamente. A imensa caridade de São Jerônimo, na sua santa preocupação e santo empenho de escrever a Verdade para os irmãos, também se manifestou nos oferecimentos das suas aspérrimas penitências, e no carinho com que acolheu os peregrinos na Terra Santa, preocupando-se em providenciar hospedarias para eles. E belíssima é a sua declaração “...para chegar ao Céu, é preciso suportar tanto a boa quanto a má reputação.” – pois revela não apenas a sua disposição de enfrentar as injustiças por causa de Jesus, mas também a profunda humildade, que é a primeira e mais necessária das virtudes, para não se deixar levar pela vaidade, particularmente como intelectual que era, pois é notório que grandes pensadores e acadêmicos sofrem facilmente as seduções da vanglória. E não poucos, por causa disso, querendo transmitir não com fidelidade a Palavra de Deus, mas a sua própria “interpretação”, entregam-se a “releituras” das coisas da Igreja, cuja inspiração vem de outro espírito que não é o Santo.

Oração:

Senhor Deus, cuja perfeição é imutável, e que nos quisestes transmitir a Verdade do Vosso infinito amor, concedei-nos por intercessão de São Jerônimo a graça de, neste mesmo amor, buscar sinceramente o Vosso conhecimento, e com coragem enfrentarmos as asperezas, os antagonismos e as tentações do deserto desta vida, na certeza de que a fidelidade a Vós, na caridade também do apostolado aos irmãos, nos levará a repousar infinitamente junto ao lugar de onde constantemente nasceis para nós. Por Nosso Senhor Jesus Cristo e Nossa Senhora. Amém.

Nenhum comentário: